segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

a morada dos anjos

foi você um dia que me disse que o aleatório é o caminho mais interessante a seguir. "viva o shuffe", essa foi a frase escrita em mim.

"should i give up, or should i just keep chasing pavements even if it leads nowhere?"

eu nunca tinha ouvido essa música. isso acontece quando a gente divide armários virtuais. você deve ter guardado ela aqui. imagino como seria ter que um dia separar cada arquivo, catalogá-los por datas, separá-los um a um, você guardando os seus e eu os meus, apagando os do outro da memória. impossível.

daqui de onde estou sentado, nesse lugar imenso e branco, vejo círculos no teto e luzes frias por todo lugar. elas acendem as prateleiras, muitas delas, cheias de livros que nunca vou ler. estão em outra língua, uma língua que não conheço. ao redor das prateleiras, as mesas acomodam pessoas, todas elas em silêncio profundo. nunca vi tantas pessoas fazerem tanto silêncio juntas.

saio pelos corredores, passando pelas prateleiras de livros, circulando pelas mesas pessoais onde tantos deles estão lendo, estudando, escrevendo. me sinto parte daquele filme do wim wenders, que tem exatamente uma cena filmada aqui. a morada dos anjos. uma cena que vi há tanto tempo na universidade, mas que você colocou no You Tube e pude ver de novo. o armário virtual de recordações e lembranças nunca nos deixa em paz. viver a nostalgia é questão de um clique apenas. e nessas horas a internet me conforta. parece que nada está perdido, tudo está lá. posso clicar em mim mesmo e me acessar, trazendo de volta uma época, um sentimento, uma estranha sensação de viagem no tempo.

pois eu aqui sou como um dos anjos, olhando para cada um deles, enquanto percorro os corredores e escadas. ninguém me olha, ninguém se distrai com meus passos. sou invisível. sinto vontade de poder tocá-los, para ouvirem suas aflições e angústias, entender o que sentem e poder confortá-los. mas não. não falo sua língua, nem compartilho de seu raciocínio. mas posso sentir algo muito forte vindo de cada um deles. são muitos. o ser humano emana uma energia absurda e todos juntos me mostram o silêncio mais ensurdecedor que eu já presenciei.

muitas vezes a música alta, as conversas ao redor e cafés sendo derrubados por atendentes com pouca experiência chegam a me atrapalhar um pouco. talvez em silêncio eu os entenda um pouco mais. e me bate a vontade de subir naquela estátua enorme de anjo dourado, no meio daquele jardim que eu nunca entrei. me jogar de vez. sair da condição de invisível e mergulhar em um mundo novo.

como no filme: falar a sua língua, fazer parte do seu mundo, entender a sua poesia, sentir novas coisas que hoje não sou capaz de sentir. talvez as minhas dores e angústias hoje não fariam mais sentido após a queda. ou talvez eu começasse a sentir novas dores e angústias de um lugar que mal conheço. medo. medo de se jogar. a distância ainda me proporciona conforto. ser o olho que vê de fora me permite inventar diálogos, criar cenas possíveis, brincar de anjo. eles são personagens, não são reais. vivem nesse mundo, enquanto eu os vejo de fora.

aqui de cima, a cidade me atenta e enquanto não decido pular, a vida me leva no shuffle.

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